O Brasil que envelhece: dados do IBGE
Há uma profundidade, uma clareza e uma resiliência que só podem vir com os anos vividos
Por Juraciara Vieira Cardoso
Ao longo da história humana, as marcas do tempo nos corpos e mentes das pessoas têm sido objeto de contemplação, respeito e reverência. De Sócrates a Confúcio, os grandes pensadores enfatizaram a sabedoria que vem com a idade, vendo o envelhecimento não como uma diminuição, mas como um acúmulo de experiências e conhecimentos. Na era atual, no entanto, a velocidade vertiginosa da vida moderna muitas vezes nos cega para a riqueza que a passagem do tempo oferece.
Na semana passada, dados divulgados pelo IBGE iluminaram uma realidade que talvez muitos de nós não tenhamos percebido em sua plenitude: estamos vivendo em uma sociedade que envelhece rapidamente. Segundo os dados, de 2010 a 2022, o índice de envelhecimento no Brasil cresceu de forma significativa, passando de 30,7 para 55,2. Em termos simples, isso indica que agora há 55,2 idosos para cada 100 crianças de 0 a 14 anos, em comparação com os 30,7, de uma década atrás. Este fenômeno é ainda mais pronunciado em municípios menos populosos, onde a desproporção é de 76,2 idosos para cada 100 jovens.
Estas estatísticas não são apenas números. Elas nos convidam a repensarmos o que significa viver, envelhecer e ser parte de uma sociedade em constante transformação. Toda transformação social é uma oportunidade de introspecção e aprendizado. A filósofa Simone de Beauvoir, em sua obra A Velhice, reflete sobre a condição do idoso, propondo que a sociedade muitas vezes marginaliza aqueles que carregam as marcas do tempo, privando-se, assim, de uma fonte inestimável de sabedoria e entendimento.
Essa marginalização dos idosos destaca uma falha fundamental na forma como percebemos a progressão de nossas próprias vidas. Em vez de tratá-la de forma linear, onde cada fase oferece seus próprios dons e desafios, tendemos a exaltar a juventude como o pico da existência, relegando as etapas posteriores a um declínio inevitável. Mas, o que muitas culturais ancestrais, e Simone de Beauvoir concordam é que há uma profundidade, uma clareza e uma resiliência que só podem vir com os anos vividos.
E, com uma população que envelhece de maneira tão acentuada, é fundamental que nossa sociedade comece a integrar essa sabedoria ancestral em sua estrutura. Isso significa não apenas criar cidades e comunidades mais acessíveis para os idosos, mas também reconhecer o valor intangível que eles trazem. Em termos práticos, isso poderia se traduzir em termos de programas intergeracionais, por exemplo, onde os jovens e os mais velhos podem trocar conhecimentos e experiências ou empresas que valorizem a diversidade de idade, tanto quanto outras formas de diversidade.
O desafio é mudar as mentalidades, reconfigurar as noções pré-concebidas que, muitas vezes, são transmitidas de geração em geração. Isso começa quando cada um de nós reconhece e combate o etarismo que está arraigado dentro de cada um de nós, aquela voz insidiosa que sugere que a juventude é equivalente ao valor e que os anos avançados significam uma diminuição do potencial. Em muitas culturas, a sabedoria dos mais velhos é reverenciada e buscada. Deve ser assim em todos os lugares. O envelhecimento, ao invés de ser visto como um desvanecimento, deve ser celebrado como um processo de amadurecimento e enriquecimento, um acúmulo de experiências, lições e insights que só chegam com o tempo.
A realidade que as pesquisas do IBGE demonstram é que o Brasil está vivendo um franco processo envelhecimento, e isso serve como um chamado à ação. É uma oportunidade para abraçarmos, aprendermos e evoluirmos coletivamente. Ao valorizar cada cidadão, independente da sua idade, cultivamos uma sociedade em que o legado e sabedoria das gerações passadas enriquecem nosso presente e moldam nosso futuro mais harmônico e inclusivo.
Publicado originalmente no jornal Estado de Minas
Foto: Alena Darmel/Pexels
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