Sexualidade: em 2022 ainda há muito desconhecimento e preconceito
Em Portugal, debate entre especialistas mostra tabus e desinformações ainda existentes sobre o sexo e a sexualidade. Os desvios nos comportamentos e o impacto que isso pode ter nos companheiros.
Por Alexandria Costa
Sexualidade. Um termo aparentemente simples, mas que em si traz (ainda) muita desinformação e alguns (talvez demasiados) preconceitos. E foi precisamente para desmistificar (quase) tudo o que rodeia esta palavra que a Casa do Alentejo recebeu, no passado sábado (29), a Tertúlia “Sexualidade – Conceitos e Preconceitos”, iniciativa do dinamizador cultural Luís Machado.
Falar de sexualidade é, para o psiquiatra Daniel Sampaio, perceber que existem muitas sexualidades. Estudos feitos ao longo do tempo mostram que as pessoas têm comportamentos sexuais diferentes. E tudo começa cedo. Muito cedo. Na interação com os pais. Na forma como estes lidam (e vivem) com a sua própria sexualidade e a transmitem aos filhos. Isto é particularmente importante na adolescência. E, por isso mesmo, defende Daniel Sampaio, é tão importante a educação sexual, obrigatória nas escolas. É claro que pode ser (também) ministrada pela família, mas, alerta o psiquiatra, pela intimidade da relação é pouco provável que os jovens a aceitem.
Mas ter jovens e sexualidade na mesma frase remete, alerta Daniel Sampaio, para um fenómeno que preocupa (e muito) o psiquiatra: a violência no namoro. Não só por ser algo cada vez mais constante, mas, também, por normalmente degenerar, mais tarde, em violência doméstica. Por isso, Daniel Sampaio defende que tem de se atuar junto dos jovens e de intervir (de forma o mais precoce possível) sempre que se detecta situações de violência no namoro. Porque desta forma “estamos a fazer prevenção à violência doméstica“, afirmou perentório (peremptório/BR), acrescentando que muitos homens violentos já o foram na sua adolescência.
E depois não nos podemos esquecer da violência psicológica, tão difícil de provar e que agora também é feita pela internet, no chamado cyberbullying. “A violência escondida é muito difícil de provar“, refere o psiquiatra, que acrescenta que normalmente os jovens que são vítimas de violência são-no durante muito tempo antes de os pais e/ou os professores perceberem. E é por isso mesmo que “é importante discutir estes temas na escola“.
Por outro lado, acrescenta Daniel Sampaio, temos de perceber que a violência no namoro está muito relacionada com a figura da masculinidade tóxica. A figura do macho alfa que tem de “dominar completamente a rapariga”. E aqui entra, também, a questão do ciúme. Que faz parte da relação amorosa “desde que não se transforme num ciúme patológico”.
Por isso é que é importante, quando se trabalha com vítimas de violência doméstica, torná-las conscientes de que estavam uma relação abusiva. Porque na maioria das vezes não se apercebem. Em grande medida porque “normalmente são homens extremamente sedutores”, em que “a mulher convence-se que é a última vez que ele é violento e o ciclo de violência continua“.
Já Madalena Serra acrescentou que, ao contrário do que se poderia pensar, o facto de alguém padecer de uma doença psicopatológica não significa, automaticamente, que seja imputável aos olhos da lei. Pelo contrário. Como revela a psiquiatra, há uma escassa percentagem de criminosos sexuais que são considerados imputáveis. Madalena Serra acrescenta que a abordagem terapêutica passa muito pelo reconhecimento do crime e pela reabilitação comportamental.
Daniel Sampaio revela preocupação com a violência no namoro. Por ser algo cada vez mais constante e porque normalmente degenera mais tarde em violência doméstica.
Mas falar de sexualidade é também ter a noção de que só recentemente se começou, realmente, a falar da sexualidade feminina. Sabiam que o clitóris tem mais de 8.000 terminações nervosas? O certo é que ao longo dos séculos sempre se deu mais importância a tudo o que está relacionado com o sexo masculino. Hoje isto começa a mudar, desde logo pela perceção de que as mulheres têm, inequivocamente, de dizer sim a uma relação sexual. Uma relação que tem de ser prazerosa e querida por ambos os parceiros. E que, revela a psicóloga, não tem, obrigatoriamente, de implicar penetração. Aliás, refere, apenas uma pequena – cerca de 10% – das mulheres têm um orgasmo com a penetração. E é por isso mesmo que outros comportamentos, como os preliminares, são tão importantes.
Nuno Monteiro Pereira, por seu lado, relembrou a importância do pénis e que as doenças associadas ao mesmo podem pôr em causa a masculinidade. E deu como exemplo a doença de Peyronie, caracterizada pelo desenvolvimento de placas fibrosas no órgão masculino. O que acontece, revelou o urologista, é que, quando isso acontece, os homens normalmente pensam logo em cancro e adiam a visita ao médico. Só lá vão quando a situação já perturba a vida sexual. Quer isto dizer que se há desconhecimento em relação ao órgão feminino o mesmo continua a acontecer em relação ao masculino. A comunicação, principalmente com os mais jovens, torna-se, assim, imprescindível.
Num debate sobre sexualidade não poderia faltar a questão da gastronomia, mais precisamente, a comida afrodisíaca. Leonor Godinho, que antes de ser chef estudo psicologia, revela que, depois de ter estudado o assunto, descobriu que há, sim, alimentos que tendem a despertar o desejo sexual. Ou pelo menos a predisposição para. E isso porque, em grande medida, alimentam o corpo, dando-lhe a energia necessária. E deu o exemplo da tâmara, cuja porção equivale a uma refeição completa. Ou o trigo, que é associado à fertilidade. “No imaginário feminino um homem que sabe cozinhar é muito sexy“, acrescentou.
Publicado originalmente em Diário de Notícias
Foto: Encontro de especialistas discute a importância das preliminares para sexo/Pixabay
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