Setembro marca luta por diferentes causas

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No mês que remete a marcos das mais diferentes iniciativas, o VSP traz entrevista com jovem que teve os primeiros sintomas de surdez informados por colegas de trabalho

Por Cleber Siqueira

O mês de setembro é utilizado como um importante marco das mais diferentes iniciativas. Pode ser que a primeira que chegue à sua mente seja o “setembro amarelo” que remete ao mês de prevenção ao suicídio, afinal, é a mais midiática delas, mas ainda temos o “setembro verde”, de inclusão da pessoa com deficiência, o “Roxo”, que diz respeito a (no mínimo) 3 campanhas, como a conscientização sobre a fibrose cística, da doença de Alzheimer e do combate ao câncer de pâncreas, isso sem contar que, entre outros, setembro também marca o mês de luta contra gordofobia.

Porém, temos o “setembro azul”, que trata do mês de visibilidade da Comunidade Surda, que, na realidade, tem início no dia 10, quando se comemora o Dia Mundial da Língua de Sinais.

E, hoje, 26 de setembro celebra-se no Brasil o Dia do Surdo. Data escolhida em razão da fundação da primeira escola de surdos no país, o Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES), em 1857, na cidade do Rio de Janeiro. Atualmente, o INES atende cerca de 600 alunos.

Durante todo mês a comunidade surda do Brasil se reúne em eventos dedicados ao debate de suas pautas, como a educação dos surdos e a criação de escolas bilíngues, nas quais o ensino de Libras também seja obrigatório.

As celebrações terminam exatamente no último dia do mês, 30, com o Dia Internacional do Surdo, quando é lembrado também Dia Internacional do Tradutor Intérprete de Línguas de Sinais.

E para marcar a data, o VSP traz, abaixo, a entrevista da jovem Michele Bezerra Pinheiro ao iBahia. Ela descobriu a deficiência na fase inicial, após alerta de colegas de trabalho. Com o tempo, o nível aumentou e os aparelhos auditivos se tornaram indispensáveis.

Por Alan Oliveira

Michele Bezerra Pinheiro tinha apenas 23 anos quando alguns colegas passaram a observar que ela não ouvia bem no ambiente de trabalho. Na época, a baiana atuava com atendimento de telemarketing e não suspeitava que poderia um dia ter a vida mudada pela deficiência.

Eles ficaram durante uma semana fazendo esse tipo de teste e sem me avisar. E aí, quando completou uma semana, eles me chamaram e falaram que tinham momentos que eles me chamavam e realmente eu não ouvia. Foi difícil aceitar. De início, é um baque“.

Foi em uma consulta e após alguns testes que Michele soube que só tinha cerca de 15% da audição no ouvido direito. Para ela foi um susto, e foi aí que o medo do preconceito começou a mexer com sua autoestima. “No início foi difícil. Chorei. Fiquei um pouco apreensiva para usar o aparelho. Tinha medo, de fato, do preconceito“, conta.

Passados alguns meses, Michele teve mais uma surpresa: o ouvido esquerdo também passou a ter restrições. Esse, no entanto, tinha cerca de 75% da audição. Foi aí que a baiana passou a usar dois aparelhos auditivos e um alerta se acendeu para o risco da perda de audição aumentar.

Eu comecei a sentir uma dificuldade também no ouvido esquerdo. Eu falei: ‘Não é possível’. E aí voltei para médica, repetimos os exames e ela falou: ‘Você está perdendo audição no ouvido esquerdo‘”.

Da descoberta até esta segunda-feira (27), Dia Nacional do Surdo, já se passaram cerca de 7 anos, e, até então, Michele ainda não sabe o que provocou a perda da audição.

Fizemos vários exames para a gente saber de onde é essa perda auditiva, de onde está vindo, porque minha perda é gradativa. E aí a gente não conseguiu descobrir o real motivo“, lembra.

A baiana conta que chegou a reunir familiares para questionar se havia algum histórico, mas ela era a primeira de que se tinha conhecimento a ser diagnosticada precocemente na família.

Pedi por favor para saber se alguém teve algum problema, se eu tive algum problema quando eu era criança, e foi dito que não. O problema que tinha foi do meu bisavô, mas pela idade“.

E dessa união familiar saiu também o apoio que a baiana precisou para superar o preconceito e lidar com as travas que a impediam de usar os aparelhos auditivos corretamente.

Foi um momento bem difícil, mas minha família, meus amigos, sempre me incentivando“, conto e seguiu destacando. “Depois que eu comecei a usar aparelho, começou a parecer um imã. Comecei a ver pessoas na rua também usando aparelho. Aí eu vou me aceitando mais. O preconceito acabo deixando um pouquinho de lado, porque realmente a gente tem que se sentir bem“.

Michele lembra da importância da família que sempre a incentivou
Foto: Arquivo Pessoal

Atualmente, Michele consegue lidar melhor com a deficiência e já criou seus hábitos de segurança, mas ainda passa por situações complicadas no dia a dia. Uma das mais marcantes para ela foi quando quase se acidentou no metrô, por não ouvir o alerta de fechamento da porta do vagão. Quem a salvou foi uma amiga.

Ela passou na frente para sair do metrô e eu passei atrás. No que eu passei atrás, a luzinha piscou, dizendo que a porta do metrô estava fechando. Eu não vi e nem ouvi. Eu simplesmente fui. Ela me deu um empurrão (a amiga). Porque ela ia fechar e eu não vi. Eu falei: ‘Meu Deus, que susto‘”.

A baiana também ressaltou as complicações em se comunicar durante a pandemia, principalmente no período mais crítico, quando o uso de máscaras se tornou obrigatório – impedindo a leitura labial que a ajuda a entender o que o outro fala.

Me quebrou real, porque eu fazia muita leitura labial. Podia não estar ouvindo você, mas eu lia muito. Eu fazia muita leitura quando eu estava conversando com os colegas, amigos e familiares. Eu não olhava para os olhos, eu olhava para boca, então a gente conversava fazendo muita leitura labial. Foi muito difícil eu me adaptar“.

A adaptação foi feita também no trabalho. De uma função em que o fluxo de comunicação era muito grande, a baiana passou a atuar em uma atividade administrativa. A mudança aconteceu depois que Michele entendeu que tinha algumas limitações e direitos. Nos últimos anos, ela tem desempenhado a função de auxiliar administrativa no laboratório Sabin.

Na empresa anterior que eu trabalhava, eles informaram que não era considerado PCD (pessoa com deficiência). Continuei lá e aí quando foi em 2021 eu fui demitida. E aí continuei colocando meu currículo como vaga normal. E aí a médica conversou comigo e falou que era para eu começar a colocar para vagas de PCD“, explicou.

Para além das dificuldades pela pouca audição, Michele conta que já passou também por muitas situação desagradáveis provocadas pelo preconceito.

Algumas pessoas acham que é brincadeira, mas não estou ouvindo. E aí dizem: ‘Você é surda?’. Aí eu respondo: ‘Eu sou. Realmente eu sou‘”.

A maioria delas pelo equívoco de que todas as pessoas surdas também são mudas ou possuem algum tipo de dificuldade na fala.

Já aconteceu de ficarem me olhando estranho. ‘É o que que essa menina quer com esse negócio aí?”. Porque me vê conversando normal, acha que eu não tenho problema auditivo. E eu tenho“.

Aos 30 anos, Michele se divide entre os cuidados com o filho de 5 anos, o trabalho e um curso de Recursos Humanos que tem se empenhado para concluir.

Não é para a gente não se sentir cota ou deficiente, e sim que a gente é eficiente naquilo que a gente faz. Eficiente naquilo que é proposto para gente e que a gente entrega. Porque eu me considero uma pessoa normal. Entrego, sou dedicada e focada naquilo que é solicitado para mim. E é se entregar e ser forte e não ouvir mesmo as piadinhas e preconceitos que existe por aí. A gente tem que focar na gente e procurar nossa melhora. Eu estou fazendo minha faculdade. Eu estou me empenhando no trabalho, porque é crescer, olhar para frente e não olhar para trás“.

– Surdez –

De acordo com especialistas, os termos surdez ou deficiência auditiva podem ser usados tanto para classificar a perda completa quanto a diminuição de audição.

Como são vários os níveis da deficiência, ela pode impedir ou somente dificultar a percepção dos sons pelas pessoas diagnosticadas.

Além disso, uma pessoa pode nascer surda ou se tornar ao longo da vida, a depender do que acontecer, como é o caso de Michele.

Entre os fatores que podem provocar a perda da audição ao longo da vida estão:

– Infecções bacterianas

– Infecções por vírus

– Exposição a barulhos intensos

– Uso de medicamentos tóxicos ao ouvido

– Presbiacusia – envelhecimento da audição em idosos

Em caso de dificuldades, o recomendado é procurar atendimento com um médico fonoaudiólogo.

Matéria publicada originalmente no iBahia, com texto de abertura da redação VSP
Foto em destaque: Michele Bezerra Pinheiro/Arquivo Pessoal

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Redação

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