Leandro Castan e a falsa simetria
Matéria do GE, assinada por Carlos Eduardo Mansur, mostra que no futebol ainda existe quem prefira caminhar na contra-mão das lutas contra a intolerância
Publicada originalmente no GE, em 02/09/2021
A entrevista concedida por Leandro Castan nesta quarta-feira ao menos serviu para deixar uma coisa bem clara: ele não gostou de ser um dos veículos para uma das mais bonitas e relevantes mensagens já enviadas à sociedade por um clube de futebol. No dia 27 de junho, quando recebeu o Brusque para um encontro pela Série B do Campeonato Brasileiro, entre as tantas homenagens à causa LGBTQIAP+ promovidas pelo Vasco estava uma camisa em que a faixa diagonal preta fora substituída por uma nas cores do arco-íris.
Aquele dia seria lembrado pelo gesto de Cano, que retirou a bandeirinha de escanteio que estava fincada no gramado, também ela caracterizada com o arco-íris, e a empunhou como símbolo da luta contra preconceito. Mas também seria o dia em que Castan publicou em suas redes sociais uma passagem bíblica que terminava com os dizeres “Sejam férteis, multipliquem-se e encham a terra”. Àquela altura suspeitava-se que o defensor tentava marcar posição contrária à postura do clube. Já não se suspeita mais. Agora, é certeza.
Castan lançou mão de um recurso tristemente comum: escorou-se na religião, ou mais precisamente uma interpretação da bíblia, para justificar o que, afinal de contas, são seus preconceitos. Ou sua falta de empatia. Difícil conceber, em pleno 2021, que qualquer tentativa de propagar a fé, a bondade e a boa vontade entre as pessoas incentive a segregação, a exclusão e a contestação do livre exercício da orientação sexual.
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Mas ao encerrar sua entrevista, o defensor vascaíno brindou a audiência com o puro suco da autodefesa dos intolerantes, dos retrógrados ou dos insensíveis. Primeiro, admitiu que foi “teoricamente obrigado a vestir uma camisa”. Ou seja, para manifestar empatia com uma minoria, Castan precisa ser obrigado. Do contrário, não o fará. Em seguida, soltou: “Eu respeito todos, então acho que também devo ser respeitado”.
É notável a capacidade de qualquer sujeito avesso a movimentos a favor da inclusão e da solidariedade com grupos minoritários, de recorrer a falsas simetrias. Leandro Castan, um heterossexual, jamais precisou ser respeitado pela sua orientação, jamais precisou que se mobilizassem em prol de sua liberdade.
Ao contrário, a comunidade LGBTQIAP+ sofre, diariamente, com violências de toda ordem no país que mais mata pessoas por causa da orientação sexual. Estes, sim, precisam de campanhas, mensagens de afeto, homenagens e divulgação da causa. Acima de tudo, precisam de respeito. Não há igualdade para os dois lados: porque um é o lado opressor; o outro, o oprimido. Algo que a insensibilidade dele para a causa, com doses cavalares de preconceito embutidas, não lhe permite enxergar. Só faltou lançar mão de termos odiosos como “preconceito reverso” ou “heterofobia”.
A posição de Castan, aliás, ajuda a entender por que o futebol é um fenômeno estatístico na sociedade em pleno 2021: é o único mundo em que não há um só homossexual, ou ao menos alguém que tenha se declarado publicamente como tal. No dia 27 de junho, para Castan, não pareceram suficientes a resignação, o silêncio, a simples decisão de não se engajar numa das mais bonitas manifestações da riquíssima história do Club de Regatas Vasco da Gama. Ele fez questão de fincar posição, de se mover na direção da intolerância. O zagueiro teve dois meses para refletir sobre o episódio antes de se manifestar publicamente. E o que ofereceu foi desalentador. Definitivamente, é melhor lembrarmos daquele 27 de junho apenas pelas iniciativas do clube, e pelo gesto eterno de Germán Cano.
No destaque: German Cano aderiu à campanha LGBTQIA+ também nas redes sociais
Foto: Twitter
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