A representatividade da pessoa com deficiência
Nada sobre nós, sem nós
Por Ciça Cordeiro*
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), há 1 bilhão de pessoas com deficiência no mundo. No Brasil, são 18,6 milhões de pessoas com deficiência, conforme Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios Contínua (PNAD/2022) do IBGE.
Os resultados sobre a população com deficiência do Censo de 2022 só devem ser divulgados no último trimestre deste ano. Todos esses dados são fundamentais para criação de políticas públicas, mas há um descaso que traz um grande impacto para toda população e continua invisibilizando as pessoas com deficiência. Falando sobre invisibilidade, quero abordar a importância da representatividade e o protagonismo dessas pessoas.
Você já ouviu falar em cripface?
O termo é usado para denominar a prática onde atores sem deficiência interpretam personagens com deficiência. Essa atividade é muito criticada, pois retrata as pessoas com deficiência de forma ofensiva. Conteúdos exibidos em novelas, filmes, séries, teatro, propagandas etc.
Cripface vem da junção de cripped (sinônimo de disabled, pessoa com deficiência em inglês) e face (rosto, face). O fato é que, com isso, vários atores e atrizes com deficiência perdem oportunidades de emprego, oportunidade de contarem suas narrativas e serem de fato protagonistas.
Assim como no mercado de trabalho, nas artes também há preconceito e exclusão das pessoas com deficiência. Além de protagonistas, pessoas com deficiência também são consumidoras. Há muito o que desconstruir para construir. Construir um mundo novo, onde as pessoas com deficiência sejam chamadas e consultadas para escrever roteiros, para participar de comerciais, para interpretar um papel na novela ou no cinema de forma digna e justa como qualquer outra pessoa.
Por ter participado e construído festival cultural com artistas com deficiência, ouvi de vários deles que às vezes são chamados, mas quando chegam no local para gravação não há acessibilidade. Isso também é uma forma de capacitismo. Os locais não estão preparados para recebê-los. É frustrante! Mais frustrante ainda são as atitudes e comportamentos opressores que são obrigados a vivenciar na ânsia por um espaço e pela representatividade.
Atrizes e atores com deficiência deveriam interpretar papéis como qualquer outro, sobre coisas do dia a dia e não somente papéis que falem da própria deficiência. Por que não um papel de vilão ou vilã na próxima novela? Ainda hoje são pessoas vistas como infelizes ou são exemplos de superação. Ainda há uma crença que pessoas com deficiência não são capazes, seja de produzir, trabalhar ou até mesmo viver: CAPACITISMO!
– Nada sobre nós, sem nós! –
Na última novela das 9, Travessia, minha amiga querida, a talentosíssima Tabata Contri fez o papel de advogada da atriz principal. Foi lindo vê-la nas tê-las levando seu talento e muito sobre o tema “acessibilidade”.
A novela das seis – que está atualmente em cartaz – “Elas por Elas” traz outro grande amigo e super talentoso ator – o Luciano Mallmann, interpretando o papel de Carlinhos. Tanto Luciano quanto Tabata são cadeirantes.
Acredito muito que a convivência gera respeito e mudanças. Ver atores e atrizes com deficiência envolvidos e trabalhando em novelas, e filmes mostra, além do talento de cada um, que nós pessoas com deficiência somos protagonistas e não apenas coadjuvantes.
Em comemoração aos seus 100 anos, a Disney estreou recentemente o filme “Wish: O Poder dos Desejos”, nele há a presença de uma personagem com uma deficiência marcante envolvida no núcleo principal da história.
Já no Brasil, ouvi sobre a nova produção nacional, que acabou de estrear – o filme: “Chama a Bebel” – Bebel é uma jovem cadeirante que mora com a mãe e o avô no interior. Para continuar seus estudos, ela acaba se mudando para a cidade grande, onde novas adversidades passam a fazer parte de sua vida, começando com sua tia Marieta.
O problema é que a atriz é fake! Ou o que chamamos de cripface. Por que não colocaram uma atriz cadeirante de verdade? Custo acreditar que ainda temos que falar sobre esse tema se temos hoje muitos artistas com deficiência talentosos prontos para atuar. Falta representatividade!
Nada sobre nós, sem nós!
*O texto produzido pelo autor não reflete, necessariamente, a opinião do Portal VSP
Ciça Cordeiro
Colunista VSP
Jornalista, consultora em diversidade e inclusão, gestora em cultura inclusiva, comunicação e eventos acessíveis. Palestrante, atua ainda com políticas públicas para pessoas com deficiência. É a coordenadora de comunicação e consultora em DE&I no Grupo Talento Incluir.
Foto: Cláudia Guimarães/@claudiaguimaraesphotos
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