Carinho com nossos pais

Carinho com nossos pais
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Podemos e devemos ter uma conversa franca e direta com que amamos

Por Juraciara Vieira Cardoso e José Milton Junior

Será que pensamos com cuidado que um dia nossos pais saíram do hospital com um “pacotinho” lindo e maravilhoso, desencadeante de um imediato amor, mesmo antes do seu nascimento, mas que exigia cuidados constantes: dar banhos, amamentar, trocar fraldas, levantar a noite ao menos movimento daquele “pacotinho” rechonchudinho e boas bochechas rosinhas?

Impossível não se apaixonar, porém também não podemos nos esquecer que este mesmo serzinho tão afável nos tirou os tempos de lazer, passeios, viagens (em que tínhamos de levar um caminhão de tralhas para passar cinco dias de praia). E olha que vamos entender que aquele bebê não veio para ficar por um tempo. Ele seria para sempre. Dia e noite a gente faz vigília ao lado do berço, damos de mamar, colocamos eretos para arrotar e os aninhamos nos braços para que o bebê volte a dormir.

Curiosamente, na maioria das vezes os pegamos do lado direito do nosso corpo, já que assim o recém nato consegue olhar diretamente nos nossos olhos, contaminando o nosso lado direito do nosso cérebro com mais e mais amor. Ahhhhhh…… cada sorrisinho parece que fez com que o mundo se transformou em algo melhor. Acabou aquele tempo de nossa liberdade plena de ficarmos conosco mesmo sem fazer nada. O centro do mundo sofreu um deslocamento: virou nossos filhos.

São tempos calculados em décadas em que preparamos nossos filhos para que possam ter uma vida em paz, com prosperidade e comportamento ético, e quem sabe, até perpetuar a vida, nos dando netos. Quando são assim criados, chegará inevitavelmente um tempo que eles assumirão suas próprias vidas e o ciclo se reinicia. Porém aqui o problema será como nós, pais, nos comportaremos: teremos orgulho da nossa conquista de formarmos seres aptos a viverem por sua conta e risco ou teremos raiva de sermos abandonados. Muitas vezes não entendemos que nossos filhos não estão nos abandonando. Jamais. Eles estão assumindo suas próprias vidas.

Muitas vezes ficamos realmente chateados de nossos filhos não precisarem de nós para tudo, que não seguem mais cegamente as nossas determinações ou fazer tudo como acreditávamos que seria o melhor caminho. Não. Estes filhos já desenvolveram a sua individualidade, autonomia, independência e, realmente, estão desesperados para colocar todas estas ferramentas que adquiriram no decorrer da vida em prática.

Aí voltamos ao que citamos acima para analisar as duas formas tão distintas de encarar esta realidade – que se realmente criamos os filhos de maneira correta, a vivenciaremos: ficaremos exultantes com nossa capacidade de criar filhos que realmente se transformaram em adultos e têm vida própria ou ficaremos deprimidos para acreditarmos que eles assim atuam porque nos abandonam? Será que realmente isso é um abandono ou uma demonstração de que estão aptos ao mundo?

Precisamos apoiar nossos filhos na sua jornada de vida, mesmo que a sensação do ninho vazio corroa nossa alma. Sim….. eles conhecerão outras pessoas, se apaixonarão, se unirão a elas e ainda existe a possibilidade maravilhosa de nos darem netos, em que todo o ciclo recomeça, inclusive aquele amor imenso que citamos no começo do artigo, só que com a diferença de que, quando cansamos de cuidar, devolvemos aquela belezinha para os seus pais. Olha que beleza: ficamos só com a parte maravilhosa do cuidado e do amor aos nossos netos.

E ainda com a grande vantagem de que nascemos em um país que segue muito os padrões latinos de estrutura familiar, em que os filhos geralmente estão mais perto dos pais e os visitam com frequência. Somos beneficiados pela possibilidade de mantermos unida nossas famílias durante todo o nosso existir e talvez esta seja a explicação de que em menos de 20 anos os países de maior longevidade serão os portugueses e os espanhóis, que já terão todo acesso às tecnologias alemãs ou japonesas, mas manterão a mágica do bem viver: o carinho de quem nos ama. As famílias mantêm-se muito unidas e cuidando um dos outros.

Por muitas vezes, há uma distância enorme, do ponto de vista físico, que não nos permite um abraço, mas contactar pais com filhos e filhos com pais através desta imensidade de formas de comunicação pode manter o equilíbrio psíquico de todos.

Porém, em algum momento, é necessário que os pais sejam diretos e objetivos em uma conversa muito difícil: a grande longevidade que hoje já é uma realidade nos obriga a planejarmos como será o nosso final de vida e esta nossa realidade precisa ser compartilhada com nossos filhos antes que a fragilidade se manifeste. Devemos chamá-los ao dever de cuidar de nós no final da vida. Devemos cumprir nossa parte: cuidar da nossa saúde, cumprir as orientações médicas, seguir dietas adequadas, fazer atividades físicas, exercitar nossa cognição, mas, mesmo fazendo tudo isso, iremos, inevitavelmente, envelhecer e a cada dia ficarmos mais frágeis.

Esta é uma conversa difícil, pois não cabe a nós lembrarmos aos flhos que passamos mais de 20 anos de nossas vidas suprindo todas as necessidades de nossa prole. Podemos sim pedir que eles dispensem tempo de qualidade, ajuda financeira, demonstrações de carinho, cuidado e amor. Sejamos delicados neste pedido, mas é fundamental que o façamos. Como eles podem adivinhar o que estamos carecendo sem que deixemos isso claro para eles?

Interessantemente, muitas vezes a forma com que cuidamos dos nossos pais já é mais que suficiente para que eles entendam como os idosos precisam ser cuidados. É a questão do exemplo: nossos filhos repetirão o que nos veem fazendo com nossos pais e provavelmente assim nos tratarão. Não mais importante na educação que o exemplo. Nossos filhos absorvem hábitos e pensamentos da forma como percebem a forma de como cuidados dos nossos anciões.

Devemos permitir que os nossos filhos percebam que a cada vez vamos ficar mais dependentes e precisamos clarear a visão dos nossos filhos de que precisamos de outros para manter nossas vidas. A primeira reação dos nossos filhos é a dificuldade de enxergar que precisam cuidar de pessoas que sempre tiveram o papel completamente diferente: eram eles que nos cuidavam. Agora cuidaremos deles? Devemos ser muito cautelosos com nossas palavras, do cuidado ao orientar-lhes em situações de maior risco, chamar todos os familiares para que possam se unir neste cuidado.

Não podemos nos esquecer de que a sensação de estarmos realmente manifestando nosso amor aos nossos progenitores, cuidando deles nesta fase difícil desta vida tão efêmera. Para que não nos sintamos sobrecarregados ou mesmo sobre usados, devemos encarar como uma fase de aprendizado, de vivência com o exercício da empatia e da humanidade para com as pessoas que mais nos amaram e nos fizeram o que somos. Se eles nos deram ferramentas para cuidar de tantas coisas, certamente estão municiados de conhecimentos e dedicação para nos cuidarem.

Existem várias relações pais e filhos que foram permeadas por dificuldades, abandono, faltas diversas e talvez esta fase seja um ótimo período para que possamos exercer o perdão, lembrando sempre que, se eles não nos deram mais em determinadas fases da vida, não era porque não queriam. Provavelmente era porque não receberam ou não tinham mecanismos e ferramentas para dar mais. Se pudessem, provavelmente teriam nos oferecido.

Assim pensando, quem sabe consigamos perdoar com mais facilidade? Quando manifestamos o cuidado de cuidar de quem nos cuidou podemos desencadear sensações maravilhosas, com a alegria de crermos que estamos dando o melhor para quem, indubitavelmente, nos amou e muito se esforçou para forjar os seres humanos que hoje somos. Sejamos gratos a eles. Entendamos este cuidar como uma forma de retribuir e reforçar o amor filial, que nasceu do amor paternal e que, a depender de como tratamos nossos pais, farão também com que seus netos exerçam este papel.

Assim, creio que a mensagem final é que podemos e devemos ter uma conversa franca e direta com quem amamos: um dia vou precisar dos seus cuidados, pois diferentemente de quando eu te criei, quando a cada dia que passava você ficava mais independente e eu, menos necessário na sua sobrevivência, agora ocorre exatamente o contrário: a cada dia que passa seremos mais dependentes e mais precisaremos de cuidados. Cremos que este cuidado é que realmente diferencia os seres humanos (espécie) dos humanos (pessoas com alma e sentimentos).

Publicado originalmente no jornal Estado de Minas
Foto: Mãe e filha conversam/Pexels

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