Mercado de trabalho: como o recrutamento anônimo aumenta diversidade nas empresas
Entrevista de emprego anônima é a aposta do mercado de trabalho em busca de justiça social. O experimento parece estar virando tendência entre as grandes empresas e veio para ficar.
Por Kauê Vieira
A farmacêutica dinamarquesa Novo Nordisk foi uma das empresas a adotar o método inovador de entrevista de emprego sem que o recrutador saiba quais são as características da pessoa que se candidata a determinado posto de trabalho.
“A implementação da ferramenta em nossos processos teve início aqui no Brasil em agosto deste ano e tivemos 85% das vagas de Liderança Sênior fechadas com pessoas que se autodeclaram como mulheres. Esperamos explorar novas frentes de diversidade como raça, etnia, geração, orientação sexual. Sem dúvida, a ferramenta somada a ações afirmativas será muito importante para atrairmos talentos diversos e nos apoiar a elevar as discussões de diversidade na organização“, disse ao Hypeness Elisabete Strina, diretora sênior de Pessoas & Organização da Novo Nordisk.
– Como funciona? –
A entrevista de emprego anônima da empresa funciona da seguinte maneira. O candidato ou candidata entra em uma plataforma que transforma sua imagem em um avatar animado.
Assim, o responsável pela condução da conversa não sabe quem está do outro lado da tela, inibindo qualquer julgamento a partir das características físicas da pessoa – algo ainda comum no mercado de trabalho brasileiro.
“O objetivo [da iniciativa] é reduzirmos vieses nos processos de tomada de decisão na escolha de candidatos, assim como explorarmos alternativas para trazermos uma experiência mais significativa para nossos candidatos“, pontua Elisabete.
A proposta de entrevista de emprego anônima adotada pela Novo Nordisk foi implementada pela Jobecam, que tinha como objetivo aumentar a diversidade nos quadros da companhia.
Diversidade implica também no aumento da presença de pessoas com deficiência (PCDs) nas grandes empresas. Mesmo que exista uma lei que preveja pelo menos de 2% a 5% de vagas preenchidas por PCDs em empresas com 100 ou mais funcionários, a diversidade ainda é falha.
A Subsecretaria de Inspeção do Trabalho, ligada ao Ministério da Economia, mostra que cerca de 372 mil pessoas com deficiência estão ativas no mercado de trabalho. Os anos de 2015 a 2019 registraram acréscimo de 12,42% nas contratações, o que para muitos especialistas é resultado da Lei de Cotas.
“Temos caminhado de forma acelerada dentro de nossa agenda de Diversidade e Inclusão, definindo estratégias e objetivos claros para alavancarmos ainda mais no tema“, ressaltou Elisabete Strina.
– Quebrando pactos –
A escritora Cida Bento, uma das fundadoras do CEERT (Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades), afirma no livro o “Pacto da Branquitude”, que o mercado de trabalho ainda é um dos grandes cinturões de racismo.
“É um pacto não verbalizado, não combinado e silencioso, que faz com que brancos sempre deem preferência a brancos para os melhores lugares sociais e se fortaleçam mutuamente nesses lugares“, declara a socióloga em entrevista à DW Brasil.
Por isso, iniciativas como o recrutamento anônimo são tão importantes para a inclusão de pessoas não brancas no mercado de trabalho.
Além de Elisabete, que representa o RH da multinacional, a reportagem do Hypeness ouviu um dos beneficiados pelo programa de entrevista de emprego anônima implementado pela Novo Nordisk.
Caso do colombiano Daniel Eduardo Mazza Martinez, hoje consultor do Hub de Inovação Digital da Novo Nordisk, que destacou o caráter inovador da metodologia e aproveitou para citar as diferenças para os modelos tradicionais de entrevista de emprego.
“Uma das principais diferenças diz respeito ao engajamento da equipe de Talent Acquisition da Novo Nordisk, que fez eu me sentir muito mais acolhido e incluso durante todo o processo. Normalmente, em metodologias tradicionais, você acaba se relacionando mais com a equipe da RH da empresa no dia da entrevista/prova, mas na Novo Nordisk foi um relacionamento construído no pré e no pós“, declarou.
O funcionário beneficiado pelo sistema de entrevista de emprego anônima continua com seus raciocínio. “Nunca antes tinha participado de um processo em que não quisessem saber meu nome, idade, cor ou de onde sou, e sim quais são meus conhecimentos técnicos e profissionais.”
E Daniel finaliza: “Como a entrevista anônima foca mais nos conhecimentos de cada um, tive a sensação de que é muito mais objetiva e poupa mais tempo de ambas as partes – da empresa e do candidato“.
O recrutamento anônimo ataca também o preconceito de gênero, já que a voz do candidato passa por um processo de distorção. A reclamação procede, conforme mostra uma pesquisa recente do Linkedin.
O levantamento realizado em 2021 ouviu 2 mil profissionais brasileiras entre 22 e 55 anos para revelar o que já era sabido: 82% das entrevistadas manifestaram a percepção de que tinham menos direitos do que os homens no ambiente de trabalho.
Como já foi citado, a plataforma adotada pela Novo Nordisk foi desenvolvida pela Joebecam, que é enfática em apontar os reflexos positivos no aumento da diversidade. A avaliação de cinco empresas resultou em aumento de 85% na contratação de mulheres, 58% de pessoas negras e 49% de LGBTQIA+.
“Um dos principais papeis do RH dentro dessa agenda foi apoiar os gestores e a alta liderança no processo de Change Management, onde a principal mensagem foi reforçar que a ferramenta viria para somar ao processo, possibilitando trazer maior eficiência e o foco nas respostas dos candidatos“, ressalta Elisabete Strina, diretora sênior de Pessoas & Organização da Novo Nordisk.
“A aceitação dos líderes foi muito positiva, estamos caminhando em direção a uma cultura que abre espaço para inovação, diversidade e inclusão, assim como discussões que, apesar de nos tirarem da zona de conforto, ampliam nossos horizontes“, finaliza.
Publicado originalmente no portal Hypeness
Foto em destaque: Marcus Aurelius/Pexels
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