Mãe e preta

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A falta de representatividade e a desigualdade social vivida por mulheres pretas que enfrentam o racismo no Brasil

Por Fabiana Conceição*

No mês de maio comemoramos uma das datas mais simbólicas comercial e culturalmente no Brasil e no mundo – o Dia das Mães. Te convido para juntos refletirmos e nos provocarmos sobre algumas mães brasileiras que não são contempladas nas campanhas de marketing, que não estão dentro do ambiente organizacional, mas estão à margem, invisíveis dentro da nossa sociedade.

Diariamente, vemos o desafio da igualdade de gênero no nosso país, onde mulheres recebem 20% menos que os homens, mesmo assumindo as mesmas funções, com mesmo perfil de escolaridade e com menor crescimento profissional ao longo da vida. Além disso, as taxas de desemprego entre as mulheres é 54% maior que a dos homens, segundo IBGE.

E a situação consegue ser mais desafiadora quando trazemos dados que apontam que 48% dos lares brasileiros têm mulheres como chefes de família, sendo ela, a principal responsável pelo sustento da casa e dos filhos. 

Olhando estes dados, podemos pensar e cobrar ações para uma mudança social efetiva que iguale os direitos entre homens e mulheres. Contudo, eu costumo dizer que nenhuma ação, iniciativa, projeto ou qualquer atividade ligada a diversidade e inclusão que não tenha um olhar interseccional, pode ser honesta e eficaz.

Interseccionalidade é a sobreposição de marcadores sociais, que localiza o indivíduo em várias camadas de situações desiguais perante outras pessoas ou grupo, gerando discriminações com características singulares.

Proponho que façamos um exercício de olhar interseccional para elucidar o que trouxemos como conceito interseccional. 

Muito bem, quando nos aprofundamos nos dados, fazendo recortes de raça, gênero e condição social dos índices apresentados no início do texto, descobrimos que a renda da mulher negra é 57% menor do que homens brancos, 42% menor do que mulheres brancas e 14% a menos do que homens negros recebem.

Sabe o dado sobre os 48% dos lares brasileiros terem mulheres como chefes de família? Destes lares, 60% são chefiados por mulheres negras e um dado ainda pior-   63% dos lares chefiados por mulheres negras está abaixo da linha da pobreza! Para o IBGE, a linha da pobreza é quando uma família vive com cerca de R$ 420,00 por mês. 

Estes dados mostram o que a intelectual Karla Akotirene chama de colisão entre avenidas identitárias, pois cruzam experiências discriminatórias de raça, gênero, condição social e até de território – caso seguíssemos intersecção dos dados e avaliássemos regionalmente, veríamos a disparidade entre regiões do nosso país e sem dúvida o Norte e Nordeste apresentariam os piores resultados.

É comum vermos discursos que deturpam o olhar interseccional, e o entende como um divisor de gênero, um separador de raças, que a luta das mulheres é única, por exemplo. 

Dados como estes mostram a disparidade entre mulheres pretas e brancas e olha que não trouxemos informações que mostram a situação de uma mulher preta, com deficiência, lésbica e nordestina! Esse atravessamento de identidades a coloca em situações de muita desigualdade, pois ela não escolhe por hora ser negra, em outro momento mulher, em outro com deficiência e lésbica. Ela vive essa colisão identitária que a coloca em camadas sobrepostas na exclusão, à margem da nossa sociedade.

Ferramentas teóricas como a interseccionalidade são importantíssimas, pois nos permite olhar essa colisão de marcadores identitários que atinge a mulher negra em especial – a excluindo em várias camadas sociais, promovendo um pensamento mais próximo do que entendemos de justiça social, nos dando respaldo para propor e exigir mudanças que não olhe individualmente para classe, gênero, orientação sexual, territorialidade e deficiência, mas sim, como estas sobreposições exclui e  marginaliza.

Precisamos pensar e cobrar ações necessárias para efetivamente socorrer essa mulher que está na base da pirâmide, fora de maior parte das estatísticas e consequentemente, fora dos planos econômico, governamental, social e também estratégicos das organizações.

*O texto produzido pelo autor não reflete, necessariamente, a opinião do Portal VSP

Fabiana Conceição
Colunista VSP

Baiana, mulher negra, mãe de Janaína e Dandara, Fabiana é pedagoga com especialização em psicologia organizacional e diversidade e inclusão e tem pós em Gestão de Projetos. Pesquisadora e palestrante sobre o tema Racismo e Preconceito, é educadora antirracista. É ainda especialista em desenvolvimento de talentos e diversidade, equidade e inclusão na Talento Incluir.

Foto: Reprodução redes sociais

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