Precisamos de consciência humana?
Porque não basta falar de consciência humana para combater o racismo
Por Fabiana Conceição*
Todo novembro, vem a velha discussão sobre a necessidade de falar de consciência negra. O que nós, pessoas negras, já estamos tão cansadas que começamos chamar de paciência negra, porque temos que ter muita paciência para explicar o porquê não pode ser consciência humana. Falas como “Consciência não tem cor, precisamos é de consciência humana”, junto com a imagem do ator Morgan Freeman, lotam as redes sociais. E mais um ano, somos desafiadas a mostrar a importância dessa data.
Como sociedade, usamos datas específicas para dar visibilidade a temas relevantes, como o Dia da Mulher, o Setembro Amarelo para a saúde mental, o Setembro Verde para a conscientização sobre as pessoas com deficiência, o Outubro Rosa para o câncer de mama e o Novembro Azul para a saúde do homem. Da mesma forma, o Novembro Negro amplia o debate sobre a história e as questões raciais, criando momentos de reflexão coletiva sobre as contribuições negras para a humanidade. Essas campanhas não anulam a necessidade de tratar os temas ao longo do ano; elas amplificam a visibilidade.
Cheikh Anta Diop dizia que, para oprimir um povo, é preciso retirar sua história, seu idioma e sua força psicológica. Foi exatamente isso que aconteceu ao povo africano: a história foi silenciada, o idioma substituído, e a autoestima, atacada. No Brasil, a história das pessoas negras é frequentemente reduzida à escravidão, ignorando suas inúmeras contribuições para a humanidade. Não somos descendentes de escravos, mas de reis, médicos, matemáticos, engenheiros e filósofos que moldaram a sociedade. Esses fatos ilustram a genialidade africana, que deveria estar no centro das nossas aulas e conversas, pois o conhecimento africano não é uma nota de rodapé, mas a raiz da nossa sociedade.
Na escola, aprendemos que a filosofia, a matemática e a medicina nasceram na Grécia. Contudo, estudos de Cheikh Anta Diop mostram que os gregos se beneficiaram dos conhecimentos do antigo Egito, em Kemet. A mumificação prova que a medicina nasceu no Egito, demonstrando um profundo conhecimento de anatomia. O primeiro objeto matemático, datado de 35 mil anos a.C., foi encontrado na África, mas Pitágoras ainda é reconhecido como o pai da matemática. Enquanto isso, as pirâmides egípcias, erguidas dois mil anos antes, empregavam técnicas avançadas de álgebra e geometria para medir terras, construir canais de irrigação e organizar a força de trabalho — práticas que antecedem os sistemas ocidentais.
O Dia da Consciência Negra é essencial para reivindicar o direito de contar essa história sem filtros, distorções ou apagamentos. Esvaziar o significado do 20 de novembro com o conceito genérico de consciência humana é desviar o foco da urgência de confrontar o racismo estrutural e a desigualdade. A Consciência Negra rompe o ciclo de invisibilidade e resgata a justiça histórica, reconhecendo que a história negra está na base da nossa sociedade. Reconhecer isso não é um favor; é reparação.
Com a oficialização do 20 de novembro como feriado nacional, reforçar o debate se torna ainda mais essencial. Enquanto essa data não for amplamente compreendida, a história seguirá incompleta.
*O texto produzido pelo autor não reflete, necessariamente, a opinião do Portal VSP
Fabiana Conceição
Colunista VSP
Baiana, mulher negra, mãe de Janaína e Dandara, Fabiana é pedagoga com especialização em psicologia organizacional e diversidade e inclusão e tem pós em Gestão de Projetos. Pesquisadora e palestrante sobre o tema Racismo e Preconceito, é educadora antirracista. É ainda especialista em desenvolvimento de talentos e diversidade, equidade e inclusão na Talento Incluir.
Foto: Portal Demilked
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