Mercado de trabalho para profissionais com deficiência
Desafios e caminhos para a inclusão
Por Ciça Cordeiro*
O mercado de trabalho para pessoas com deficiência no Brasil ainda enfrenta barreiras significativas, tanto estruturais quanto culturais. Apesar de avanços importantes, como a Lei de Cotas (Lei nº 8.213/1991), que obriga empresas com mais de 100 empregados a destinar de 2% a 5% de suas vagas para pessoas com deficiência, os dados recentes mostram que a inclusão plena está longe de ser alcançada.
Com base em informações do Perfil Social, Racial e de Gênero das Maiores Empresas do Brasil 2023/2024 – do Instituto ETHOS, publicado recentemente, fiz uma análise das barreiras enfrentadas, dos preconceitos que continuam e possíveis caminhos para superar essas dificuldades.
Conforme a pesquisa, em 2022, apenas 29,2% das pessoas com deficiência estavam inseridas na força de trabalho, em contraste com 66,4% da população sem deficiência. Além disso, no conjunto das maiores empresas brasileiras, elas representavam apenas 3,3% dos empregados, e sua presença era quase inexistente nos níveis de liderança: apenas 0,7% no quadro executivo e 1,6% na gerência. Isso demonstra que, embora a lei tenha promovido um aumento de contratações, as pessoas com deficiência continuam invisibilizadas nos espaços de tomada de decisão.
– Barreiras e preconceitos –
Entre os principais desafios apontados pelas empresas e lideranças, destacam-se:
- Capacitismo estrutural: segundo a pesquisa, 74% das pessoas com deficiência relataram já ter enfrentado discriminação em processos seletivos. O preconceito e as suposições sobre a capacidade dessas pessoas ainda são frequentes.
- Falta de qualificação e acesso à educação: embora seja responsabilidade do Estado e das empresas criar programas que ampliem a inclusão educacional, muitas vezes a baixa escolaridade é utilizada como justificativa para não contratar ou promover pessoas com deficiência.
- Políticas insuficientes ou simbólicas: apesar de 84,2% das empresas alegarem ter programas específicos para inclusão, apenas 6,3% têm metas para a participação de pessoas com deficiência em cargos executivos.
- Desigualdade salarial: pessoas com deficiência recebem, em média, rendimentos 30% menores que seus colegas sem deficiência. A ausência de políticas robustas de equiparação salarial reforça a exclusão econômica.
– Ações necessárias para a inclusão plena –
Para mudar esse cenário, é essencial que empresas adotem medidas concretas que vão além do cumprimento da lei:
- Adoção de estratégias de diversidade interseccional: as empresas devem integrar a inclusão de pessoas com deficiência a outras iniciativas de equidade, garantindo oportunidades reais de crescimento e desenvolvimento.
- Fortalecimento de políticas de recrutamento e retenção: processos seletivos acessíveis, capacitação de gestores e ambientes inclusivos são passos cruciais para romper barreiras estruturais.
- Compromisso com a liderança inclusiva: a presença de pessoas com deficiência em cargos de liderança não apenas promove representatividade, mas também impacta a cultura organizacional.
- Investimento em sensibilização: embora 90,5% das empresas desenvolvam ações de conscientização, é preciso ir além de campanhas pontuais e trabalhar com metas claras de transformação cultural.
– O papel das empresas e da sociedade –
Empresas que lideram iniciativas inclusivas colhem benefícios como inovação, maior engajamento dos funcionários e fortalecimento da marca. Contudo, a inclusão não deve ser vista apenas como uma obrigação legal, mas como um compromisso ético. Não é por obrigação, nem por conveniência, mas por convicção.
Tenho orgulho de ser uma pessoa com deficiência e integrar a equipe de consultoras da Talento Incluir, um ecossistema dedicado à inclusão produtiva. Nosso trabalho é focado em promover o desenvolvimento de pessoas com deficiência, ampliando sua inserção no mercado de trabalho e na sociedade. Nosso propósito é desafiar e romper o capacitismo estrutural, abrindo caminho para que essas pessoas ocupem cada vez mais espaços nas empresas e na vida em comunidade.
O mercado de trabalho precisa abrir espaço para o protagonismo de pessoas com deficiência, garantindo igualdade de oportunidades em todos os níveis hierárquicos. Apenas com ações articuladas entre governos, empresas e a sociedade civil será possível alcançar um ambiente verdadeiramente inclusivo e justo.
*O texto produzido pelo autor não reflete, necessariamente, a opinião do Portal VSP
Ciça Cordeiro
Colunista VSP
Jornalista, consultora em diversidade e inclusão, gestora em cultura inclusiva, comunicação e eventos acessíveis. Palestrante, atua ainda com políticas públicas para pessoas com deficiência. É a coordenadora de comunicação e consultora em DE&I no Grupo Talento Incluir.
Foto: Kampus Production/Pexels
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